quarta-feira, 3 de outubro de 2007

As origens da Feira do Livro de Ribeirão

Um dos fundadores da Feira Nacional do Livro de Ribeirão Preto, o jornalista Galeno Amorim deu a entrevista que segue à repórter deste JO Luciana Nascimento em agosto passado. Atual diretor do Ideall (Instituto de Desenvolvimento de Estudos Avançados do Livro e Leitura), com sede em Brasília, Galeno também possui um blog (http://www.blogdogaleno.com.br).

A entrevista abaixo foi dada antes das declarações dos escritores Menalton Braff e Paulo Bentancur (ver post de 14 de setembro), que criticaram duramente a feira. Por isso, Galeno não comenta as afirmações. Braff diz que a feira perdeu seu caráter de formador de leitores e Bentancur afirma que o evento investe mais em artistas pop (da música, por exemplo) do que em escritores propriamente.Leia a seguir os principais trechos da entrevista.

A Feira de Ribeirão continua com suas atrações na cidade até 7 de outubro (http://www.feiradolivroribeirao.com.br).

Qual foi exatamente a sua participação na criação da Feira Nacional do Livro de Ribeirão Preto?
Eleito [em 2000] para seu segundo mandato, o então prefeito Antônio Palocci me convidou para assumir a Secretaria da Cultura e disse que seria importante para a vida cultural da cidade realizar uma boa feira do livro. Essa também era uma antiga idéia minha, que tinha uma atuação voltada para o tema, seja como jornalista, autor de literatura infantil ou editor. Como eu dirigia, na época, uma pequena editora que viria a conquistar vários prêmios nacionais – inclusive o Jabuti de Melhor Livro de Ficção em 2000 – tinha um bom trânsito na área. Passei a articular os apoios necessários na cidade e no país e em quatro meses organizamos a primeira feira, o que, a princípio, muitos consideravam ser um sonho impossível. Trouxemos parceiros e marcas importantes, como Ministério da Cultura, Fundação Biblioteca Nacional, Câmara Brasileira do Livro, Associação Nacional de Livrarias, Petrobrás, Banespa, Telefônica, Odebrechet, Sebrae e tantas outras. Como além de dirigente também era um técnico da área, acabei presidindo e participando pessoalmente de todas as etapas nos primeiros anos da Feira Nacional do Livro de Ribeirão Preto, da concepção e planejamento à execução e avaliação. Até quando você esteve diretamente envolvido com o evento?Estive envolvido de corpo e alma com a feira durante os pouco mais de três anos em que fui secretário de Cultura. Era comum em muitos dias trabalhar, por exemplo,18 horas por dia, sem sábado, domingo ou feriado. Mas desde o primeiro ano criamos estratégias para assegurar a continuidade da feira para após os quatro anos iniciais de recursos e um forte apoio do Poder Público. Primeiro, criamos a Fundação Instituto do Livro, vinculada à Secretaria Municipal de Cultura, para que ela cuidasse da gestão do programa que levou à implantação de 80 bibliotecas na cidade em pouco mais de três anos. E, ainda, para apoiar os autores locais e também garantir uma boa participação da prefeitura nas edições futuras da feira, quando talvez a prefeitura não conseguisse mais estar tão envolvida com o projeto – até em função de outras prioridades e da própria dinâmica da administração pública – e a feira tivesse sido absorvida pela comunidade. Por isso, antes de sair estimulei a criação da Fundação Feira do Livro, composta por representantes de diversos setores da sociedade. Cheguei a ser, por pouco tempo, seu primeiro presidente, mas deixei o cargo para assumir a direção da política nacional do livro e leitura no governo federal. Mesmo assim, em 2004, ainda ajudei como pude na organização e cheguei a trazer eventos nacionais importantes para a feira, com convidados estrangeiros. Nos anos seguintes, envolvido com novas responsabilidades que assumi em nível nacional e internacional, essas colaborações diminuíram muito.

Quais eram os objetivos principais da Feira do Livro quando de sua criação?
O objetivo central da feira sempre foi e será aumentar a leitura na cidade. Mas existiam também outras categorias de objetivos, como estimular os autores locais. Ribeirão sempre teve excelentes escritores e ilustradores, inclusive alguns ganhadores do Prêmio Jabuti (como Isaías Pessotti e Menalton Braff, de Melhor Livro de Ficção do Ano, e Lucília Junqueira de Almeida Prado, de literatura infantil). Mas muitas vezes a própria cidade não se dava conta disso. Também há dezenas de outros escritores que publicam pelas principais editoras do país e uma outra quantidade, bem maior, de autores ainda não descobertos. Mas também era objetivo de, com a Feira, levar as várias estéticas e culturais a ocuparem os espaços públicos e contribuir para a revalorização do centro da cidade, uma área que nos orgulha a todos, mas que, paradoxalmente, continua a carecer de ações mais fortes por parte do Poder Público e da própria sociedade para recuperar seu prestígio e auto-estima. A Feira também deveria ser uma das estratégias – ao lado de outros eventos culturais importantes que acontecem na cidade – para recolocar a cidade como um importante centro de cultura do país. O livro e a leitura deveriam servir, enfim, como elo para integrar as diversas estéticas e promover uma grande festa da cultura no coração de Ribeirão.

Esses objetivos foram alcançados? Se sim, em quanto tempo? Se não, por quê?
Um bom indicador é que em três anos o índice de leitura na cidade saltou de 2 livros lidos por habitante por ano para 9,7, seis vezes mais do que a média nacional e o dobro, por exemplo, do que se lê nos EUA ou na Inglaterra. Nas primeiras edições, a feira dobrou de tamanho a cada ano e rapidamente se tornou uma das maiores a céu aberto do mundo e, sem dúvida alguma, a mais charmosa do Brasil. Isso não é pouco: aonde tenho ido pelo país afora ou no exterior, as pessoas querem saber sobre Ribeirão, suas bibliotecas e sua feira. Nessas horas, não há como ter um grande orgulho de ser ribeirão-pretano. É evidente que a auto-estima da cidade cresceu e os moradores se orgulham e falam dela com afeto. Já os escritores locais – tanto os famosos como os não tão conhecidos e aqueles que ainda não possuíam livros editados – jamais, em toda a história de Ribeirão, publicaram ou lançaram tantos livros como nos últimos anos. Em 2004, por exemplo, já eram mais de 200 autores locais autografando suas obras na Praça XV nos dias de feira.

Como você analisa o progresso da Feira do Livro: houve evolução ou retrocesso? Por quê?
Quem olhar a partir de uma perspectiva para curto, médio e longo prazo verá que a Feira do Livro de Ribeirão passou, passa e ainda passará por estágios absolutamente diferentes entre si até para se fortalecer, se enraizar e se perpetuar na vida da cidade. Em um primeiro momento, o Poder Público fez os investimentos e as articulações necessárias para que a feira viesse à luz com os cuidados para um recém-nascido em seus primeiros anos de vida. Depois, a gestão da feira migrou serenamente para as mãos da sociedade, sem perder a parceria e a cumplicidade com o Poder Público. Era imprescindível, nesse momento, ter uma boa gestão política e diplomacia para que esse ritual de passagem pudesse ser cumprido e superar com serenidade as dificuldades naturais que sempre surgem nessas horas. Nesse caso, isso também coincidiu com a troca de prefeitos. Mas a Feira passou bem por tudo isso e teve, inclusive, o compromisso formal dos principais candidatos, em 2004, de que a apoiariam por estar ela acima dos partidos ou de questões menores. Mais recentemente, a idéia embrionária que permeou todo o processo de criação da feira – de um poderoso engajamento dos mais diferentes setores da comunidade para não só blindá-la como aumentar sua musculatura e força social – eclodiu com tal vitalidade que tudo leva a crer que teremos, em 2007, talvez a melhor feira de todos os tempos. Tudo isso significa uma extraordinária evolução.
Hoje, você mantém alguma ligação com a Feira?Minha ligação é, sobretudo, afetiva: a de um torcedor que acompanha das arquibancadas, vibra com cada lance dentro do gramado e que, quando convocado pelo treinador, não dúvidas: pula o alambrado e vai ajudar a empurrar o time pra frente. Mas não tenho nenhum envolvimento formal: é algo puramente voluntário. Este ano, por exemplo, tive diversas reuniões de trabalho com a diretoria da Fundação para transmitir um pouco da experiência acumulada nos primeiros anos de feira e de quem milita na causa da educação e da cultura há alguns anos no Brasil e na Ibero-América. Também procurei ajudar a articular apoios financeiros e políticos. Apenas, portanto, um trabalho de formiguinha que, inclusive, desaparece perto da grandiosidade do trabalho que vem sendo feito pelos dirigentes da Fundação Feira do Livro e seus parceiros.

Atualmente, qual é sua ocupação? Continua empenhado em projetos de incentivo à leitura?
Depois que deixei o Ministério da Cultura, em 2006, onde criei o Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL) e ajudei a instituir programas que já garantiram a instalação de 700 bibliotecas nos últimos três anos no país, passei a ter uma atuação também fora do Brasil. Presidi o Centro de Fomento ao Livro e à Leitura na América Latina e no Caribe (Cerlalc), da Unesco, cuja sede é localizada na Colômbia, e atuei como consultor de políticas públicas do livro e leitura junto à Organização dos Estados Ibero-americanos (OEI). Agora, estou bastante envolvido na consolidação do Ideall (Instituto de Desenvolvimento de Estudos Avançados do Livro e Leitura), que dirijo e tem sede em Brasília. O instituto possui várias ações para ajudar a fortalecer as políticas de leitura no Brasil – uma delas é um blog sobre o tema que possui nada menos do que 73 mil assinantes. Em breve, o instituto vai lançar uma agência de notícias exclusivamente sobre esses temas e um Observatório do Livro e da Leitura, que é um centro de monitoramento e pesquisas que vai produzir duas dezenas de novos estudos sobre o tema por ano. Mas sempre que posso estou em Ribeirão, inclusive para me realimentar dessas idéias que já deram bons frutos pelo mundo afora. Tenho raiz e vínculos muito fortes com a cidade.

sexta-feira, 21 de setembro de 2007

Ribeirão Preto vive surto de caxumba com o aumento de 785% no n° de casos da doença

Dados fechados no mês passado pela Vigilância Epidemiológica de Ribeirão Preto mostram que a cidade vive um surto de caxumba. Em 2007, foram registrados 248 casos até o final de agosto — número 785% maior do que todo o ano de 2006, que teve 28 casos no total. O surto eclodiu a partir de maio, quando houve 20 notificações, e agravou-se em junho, com 80 infectados.
A caxumba é uma doença viral aguda caracterizada pela inflamação da glândula parótida, localizada abaixo da orelha. Para evitar surtos como esse ou a ameaça de uma epidemia, o médico infectologista pediátrico do HC de Ribeirão Otávio Augusto Cintra diz que deve-se fazer vacinação de bloqueio, como ocorreu em 1997 diante de um surto de sarampo. “Acredito que a Secretaria da Saúde esteja estudando uma melhor medida para controlar esse surto”, diz.
Segundo a enfermeira da Vigilância Epidemiológica Silvia Assumpção, o vírus da caxumba é transmitido por via respiratória, por isso é comum os casos aumentarem no inverno. “É um surto, mas não se pode afirmar que vamos chegar a uma epidemia”, afirma Silvia. Ela explica que a caxumba deixou de ser tipicamente infantil para tornar-se mais freqüente em adolescentes e jovens, atingindo até adultos com mais de 30 anos.
O clínico geral Alfredo Tonello alerta que ao sinal dos sintomas da doença — inchaço e dor na região abaixo da orelha e febre — deve ser realizado imediatamente o diagnóstico através de coleta de sangue. “É importante detectá-la logo, pois a caxumba é uma doença progressiva e quanto maior o inchaço, maior será a febre”, diz o médico. E acrescenta que a caxumba também pode afetar o pâncreas, ocasionando dores na barriga e vômito. O tratamento é feito com repouso e a doença dura uma semana, em média. Tonello afirma que muito dificilmente a prática de exercícios físicos faria a doença descer para os testículos ou ovários. “A possibilidade disso acontecer é muito pequena, e quando ocorre é uma fatalidade”, enfatiza.
Para prevenir-se contra o vírus da caxumba, o representante comercial Maurício Inácio, de 29 anos, tomou a vacina tríplice viral na Unidade Básica Distrital de Saúde do bairro Castelo Branco. “É importante prevenir, pois uma semana fora do trabalho me complicaria”, diz.
Vacinação
A vacina tríplice viral, contra caxumba, rubéola e sarampo, ficou fora do calendário de vacinação até 1992, quando foi iniciada uma campanha nacional para crianças com até 10 anos. A segunda dose da vacina foi instituída para crianças entre 4 e 6 anos, em 2004. Hoje elas tomam a vacina com 1 ano e o reforço aos 5. Mas é possível que uma pessoa contraia a caxumba mesmo após receber a vacina, segundo Silvia, devido a uma falha na imunização. “A cada ano, 10% das crianças não respondem à vacina”, diz a enfermeira.
Todas as pessoas nascidas a partir de 1960 e que não tomaram a vacina devem procurar um Posto de Saúde para ser imunizadas. A segunda dose é destinada somente àqueles que entraram em contato com pessoas que contraíram a doença. “Existe um aumento do número de casos de caxumba, mas a hipótese de uma epidemia é baixa”, conclui Silvia.

Reportagem produzida pelo repórter Renê Scatena (Jornal do Ônibus, setembro de 2007)

sexta-feira, 14 de setembro de 2007

Menalton Braff critica organização e rompe com a Feira do Livro de Ribeirão Preto

O escritor Menalton Braff, que recebeu o Prêmio Jabuti de 2000 com o livro "À sombra dos ciprestes", rompeu com a Feira Nacional do Livro de Ribeirão Preto (SP). Um dos idealizadores do evento, Braff diz estar descontente com a organização do ano passado e ressalta que, desde a primeira edição, a qualidade caiu.
Participante de todas as seis edições - a Feira de Ribeirão estreou em 2001 - , Menalton é um dos principais nomes da literatura da região e do país. "Infelizmente houve um retrocesso muito grande (no evento)", lamenta. E acrescenta que a Feira do Livro não atinge o objetivo de incentivar o gosto pela leitura por ter cedido aos apelos comerciais das editoras. "A literatura já foi alijada do centro da Feira, é figura marginal, tornou-se a prima pobre. Por quê? Porque agora a visão é apenas comercial".
Uma evidência disso, e que causa polêmica entre os escritores, é a promoção de shows musicais e peças de teatro durante o evento. De acordo com o autor gaúcho Paulo Bentancur, o dinheiro investido para trazer esses artistas é muito maior do que a verba necessária para realizar eventos realmente voltados para a leitura, como salões de idéias e cafés filosóficos. “Sei de casos (de feiras de outras cidades) em que o escritor recebeu um cachê de R$ 200 enquanto uma banda foi contratada por R$ 2.000 para tocar por meia hora”. E completa: “Se o argumento (para os cachês mais altos) é que eles têm um custo mais elevado de produção, bom, então não é feira do livro, é feira de atrações”.
Mas Isabel de Farias, presidente da Fundação Feira do Livro, orgão responsável desde 2003 pela organização e realização da Feira, discorda da opinião dos escritores. "Quem pensa assim deve pleitear um lugar na Fundação e participar do conselho que define isso". Ela acrescenta que shows musicais e peças de teatro sempre estiveram presentes na Feira desde o início. Para ela, esses espetáculos têm a intenção não só de atrair as pessoas para a Feira do Livro como também de proporcionar uma opção de lazer para que o público continue no evento, pois os espetáculos não concorrem com as outras atrações da Feira. "Os shows serão iniciados às 21 horas, um horário em que a Feira encerra as atividades", afirma. Para Braff, porém, o público do livro não é o mesmo do show. "E se for, não há necessidade do show para que ele seja atraído”, ele observa.
O autor também chama a atenção para um outro aspecto comercial: a proliferação nos estandes de livros técnicos. Para ele, isso é ruim, pois não garante bons negócios para os livreiros, nem atinge o principal objetivo da Feira, que é a formação do gosto pela leitura. “Ora, ninguém vai me dizer que se desenvolve o gosto pela leitura com livros técnicos. O dentista e o engenheiro igualmente lêem literatura. Mas o dentista não lê livro de engenharia”, explica o autor. Mas Isabel ressalta que a Feira tem também um lado comercial. "As pessoas precisam entender que o escritor vive da venda do livro. Então eu acredito que a Feira do Livro de Ribeirão Preto, além de ser um espaço cultural, é um espaço para se vender livro".
Bentancur recusou três convites para a Feira de Ribeirão Preto. Segundo ele, a organização do evento faz distinção entre os escritores: nem todos recebem cachê, alguns têm que pagar as passagens e a hospedagem do próprio bolso e a outros não é disponibilizado sequer um espaço para expor os seus livros. E foram esses motivos que o fizeram desistir de comparecer em 2006, mesmo com sua presença já confirmada na programação. “Eu ia falar do Mário Quintana e meus livros recém lançados não seriam tema de nada. Eles não pagariam cachê algum para mim enquanto muitos autores de fora, que eu conhecia e com quem me correspondo, estavam recebendo valores dignos". E acrescenta: "a comissão organizadora não pretendia pagar nem a minha passagem. Esperavam que a editora pagasse. Afinal, que tipo de convite era esse?" E explica que não é só a Feira do Livro de Ribeirão Preto que age desse modo. "Eu já estou vacinado”.
Isabel diz que não pode comentar o caso de Bentancur, pois não participava da Fundação Feira do Livro no ano passado. Mas afirma que a Fundação, além de custear a hospedagem e translados, ofereceu um cachê básico para os escritores convidados para a sétima edição da Feira, que acontece de 28 de setembro a 7 de outubro nas praças XV e Carlos Gomes e imediações. Ela comenta, porém, que alguns deles não receberão pagamento. "Tem muito escritor que não vai receber nada e que está vindo porque gosta da feira, porque acha importante ter esse espaço pra poder falar". E afirma que nesta edição a organização trará autores para falar preferencialmente de seus próprios livros e não de outros escritores, como costumava acontecer.

Matéria produzida pela repórter Luciana Nascimento (Jornal do Ônibus, setembro de 2007)